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GRIFES QUE VALEM OURO

por Francisco Mattar Botelho e Erik Farina – 

Ranking inédito elaborado pela Interbrand, maior consultoria de marcas do mundo, revela quais são as marcas mais valiosas do Sul – e suas estratégias.

O que empresas como Sadia, Perdigão, Gerdau, Ipiranga e Banrisul têm em comum? Algumas atuam em setores próximos, outras se assemelham pelo vulto de seus empreendimentos. Mas há um ponto em que todas convergem de maneira unânime: são empresas que nasceram no Sul do Brasil e se destacam pela força da marca. Algumas, como a Sadia e a Gerdau, atravessaram as fronteiras de sua terra natal, ganharam estatura nacional e conquistaram o mercado externo. Outras seguiram caminhos diferentes – o Banrisul, por exemplo, manteve o foco no rincão de origem e se tornou um verdadeiro símbolo regional. As diferenças de estratégia não são apenas geográficas: para conquistar seu lugar na mente dos consumidores, as empresas do Sul usam meios tão variados quanto os produtos que oferecem. Num levantamento inédito, realizado em conjunto com Interbrand – a maior consultoria de branding do mundo –, AMANHÃ revela quais as marcas mais preciosas da Região Sul e aponta os segredos que podem transformar logotipos em cifras milionárias.

Para descobrir os principais mandamentos no manual das grandes grifes, nada melhor do que ir direto ao topo da lista. A Sadia, indústria de alimentos sediada em Santa Catarina, domina o ranking publicado por AMANHÃ com o nome mais valioso entre os três Estados da Região Sul: seu “S” estilizado é um ativo de respeitáveis US$ 189 milhões. Diversos fatores conferem essa estatura à marca da empresa. Além de ser líder nacional em todos os setores em que atua, ela também é peso-pesado no exterior – tanto que metade de sua receita vem de vendas internacionais. Ao contrário da maioria das empresas brasileiras, que exportam itens sem grife, a Sadia imprime seu selo a boa parte dos alimentos que despacha ao mercado internacional – e que levam o nome da fabricante catarinense para países como Chile, Rússia, Arábia Saudita, Turquia e Iraque.

As vendas externas da Sadia são acompanhadas por campanhas de marketing nas línguas locais: hoje, o mascote da empresa aparece em comerciais falados em árabe, espanhol e russo. O resultado é que os produtos acabam se vinculando fortemente à marca. Um bom exemplo dessa simbiose está no Oriente Médio, que absorve mais de 20% das exportações da companhia. Entre os habitantes da região, a palavra “Sadia” é usada como sinônimo de “frango industrializado” – da mesma maneira que, no Brasil, “gilete” equivale a “aparelho de barbear”. “Os árabes não comem frango. Eles comem um “Sadia”, ilustra Fernando Galante Moraes, gerente de marca corporativa da empresa.

Ostentar é preciso

A publicidade, claro, ainda é a principal arma na busca pelo brand awareness – um termo chique para “reconhecimento de marca”. Essa batalha é travada em diversas frentes. Para agregar valor a suas grifes, as empresas mais eficientes exploram todas as chances de exibi-las. Na prática, isso significa colocar o logotipo onde quer que haja espaço sobrando. A gaúcha Ipiranga, que ocupa o quarto lugar no ranking da Interbrand, leva essa regra ao pé da letra. O inconfundível “I” amarelo em fundo azul, símbolo do conglomerado, não aparece apenas na fachada dos postos de gasolina, mas também no macacão dos frentistas, nos caminhões que distribuem os combustíveis, nas embalagens de óleos… “Vendemos uma commodity, e os postos são nossas embalagens”, resume Alfredo Tellechea, Diretor-Superintendente da Ipiranga Distribuidora, o principal braço da companhia. Essa “embalagem”, por sinal, passou a conter muito mais do que combustíveis. Hoje, os postos da empresa contam com verdadeiros shopping centers em miniatura – os AmPm’s, abertos 24 horas por dia, aparatados com farmácias, vídeolocadoras e caixas eletrônicos. Ou seja: o logotipo da Ipiranga acompanha clientes até mesmo na hora de comprar aspirina ou alugar um filme para o fim de semana. É um verdadeiro selo de garantia – cujo valor, segundo a Interbrand, chega a US$ 175 milhões.

Um trabalho constante de branding pressupõe doses proverbiais de paciência. Construir uma marca forte é como lapidar uma obra de arte: cada movimento é friamente calculado, e, desde o início, sabe-se que os esforços podem demorar um bom tempo para resultar em ganhos tangíveis. “O branding eficiente exige divulgação ininterrupta. Se a companhia deixar essa regra de lado, seu nome logo começará a perder impacto”, afirma Lígia Fascioni, Diretora da Consultoria Gestão Integrada de Unidade Corporativa, de Florianópolis. A fabricante catarinense de alimentos Perdigão é um exemplo dessa persistência: desde 1970, quando estreou no varejo, a empresa não interrompeu por um único momento suas campanhas de divulgação. Não por acaso, a empresa ocupa o segundo lugar no ranking publicado por AMANHÃ, com uma marca de US$ 182 milhões.

Nem só de publicidade vive uma marca forte. Pelo contrário: confiar cegamente no poder da propaganda é um erro que, em casos extremos, pode levar uma empresa ao ostracismo. Exemplo clássico disso é a californiana Xerox. Surgida em 1956, a companhia foi pioneira mundial na tecnologia de fotocopiadoras. Dona de um produto inovador para a época, a empresa mergulhou fundo em campanhas de publicidade, divulgando seu serviço – e sua marca – pelos quatro continentes. O esforço deu certo: até hoje, o nome da empresa é inseparável do produto que a tornou famosa. No Brasil, por exemplo, o verbo “xerocar” ainda é sinônimo informal de “fazer uma fotocópia”. O curioso é que, com o tempo, a força da grife acabou prejudicando a companhia. Preocupada apenas em aumentar a fama, a fabricante norte-americana esqueceu de continuar se renovando. Em pouco tempo, o produto que ela havia lançado na metade do século se tornou o carro-chefe de outras empresas, mais jovens e arrojadas. E a Xerox, que lapidou durante anos uma imagem ligada à tecnologia de ponta, foi deixada para trás na maratona do mercado. “Ela foi extremamente eficaz no que diz respeito à comunicação – mas, no final das contas, essa eficiência foi tanta que acabou se tornando destrutiva. A companhia deu atenção exclusiva à propaganda e acabou se esquecendo de que tinha concorrentes”, avalia Marcelo Peruzzo, Diretor da IP2 Marketing de Resultado, de Curitiba.

A Xerox pagou caro por seus erros. Nas propagandas, alardeava um caráter inovador – mas, na prática, os itens que oferecia eram cada vez mais ultrapassados. Essa contradição foi fatal para sua credibilidade. O público, claro, continuou a “xerocar” documentos – mas, agora, dava preferência a máquinas fabricadas pela Canon, Sharp ou Ricoh, por exemplo. Embora sua marca ainda seja poderosa – em 2005, ela foi avaliada em US$ 5,6 bilhões –, o valor de mercado da companhia despencou 89% entre 1999 e 2000. Para sair do buraco, a multinacional vem investindo pesado em campanhas que tentam desvinculá-la do setor de fotocopiadoras. Segundo Jeffrey Swystun, Diretor Global da Interbrand, casos como esse servem para ilustrar um dos princípios fundamentais do branding. “As empresas precisam ser capazes de entregar aquilo que sua marca promete”, alertou o especialista, em um seminário especial promovido por AMANHÃ.

Em outras palavras: de nada adianta popularizar uma marca, se o conteúdo não corresponde à embalagem. Tanto é que, no ranking publicado por AMANHÃ, nem todas as empresas se destacam apenas por investir pesado em propaganda. A siderúrgica Gerdau é um exemplo. Considerada por diversos analistas como a maior multinacional brasileira, a empresa é dona de uma marca avaliada em US$ 178 milhões – a terceira mais valiosa do Sul. No entanto, seus investimentos em marketing comercial, destinado ao grande público, são modestos, se comparados com os de outras companhias do mesmo porte. Anualmente, a siderúrgica gasta cerca de R$ 15 milhões em campanhas de publicidade no varejo. No caso da Perdigão, o volume é de R$ 40 milhões.

Para ganhar a confiança dos consumidores, a siderúrgica gaúcha prefere investir em iniciativas culturais e sociais – entre elas, programas de alimentação para populações de baixa renda e campanhas para divulgar os riscos do câncer de mama entre o público feminino. Essas ações, que consomem cerca de R$ 34 milhões por ano, não se limitam às fronteiras do país: atualmente, a Gerdau está participando dos programas internacionais para auxiliar as vítimas do furacão Katrina, que devastou a cidade de Nova Orleans, nos Estados Unidos, no início de setembro. Esforços como esse geram ganhos indiretos, mas nem por isso menos eficazes: mesmo com seu low profile, a Gerdau é vista pelo público como uma empresa de valores sólidos. “Não precisamos fazer muita publicidade para mostrar nossa filosofia. As pessoas percebem, no dia-a-dia, que princípios como responsabilidade social estão no DNA da Gerdau”, explica José Paulo Soares Martins, Diretor de Marketing da siderúrgica.

O Banrisul é outra empresa da região que enveredou com sucesso pela trilha do marketing vinculado a causas sociais. Um dos últimos bancos públicos estaduais do país, o Banrisul tem 90% de seus correntistas instalados no Rio Grande do Sul. Para cativar esse público, a instituição apóia diversos programas comunitários no Estado – por exemplo, campanhas de arrecadação de agasalhos para crianças carentes. Além disso, o banco dá suporte financeiro a alguns dos principais eventos culturais em território gaúcho, como o Festival de Cinema de Gramado e a construção do Multipalco – espaço cultural com 13 mil metros quadrados que está sendo erguido em Porto Alegre. A instituição também patrocina os dois principais clubes de futebol do Estado e, em suas campanhas, bate com insistência na tecla da tradição. “Concorremos com muitos bancos privados – nacionais e internacionais. Precisamos ter uma identificação com o povo gaúcho – e por isso nos mostramos engajados com o desenvolvimento do Estado”, revela Fernando Lemos, Presidente do Banco. Essa mensagem de cumplicidade com o cliente é um dos elementos que conferem à marca do Banrisul seu valor de US$ 150 milhões.

Coca-Cola é isso aí

“O que determina o peso das marcas mais valiosas do Sul é o posicionamento e a consistência”, resume Eduardo Tomiya, Diretor da Interbrand no Brasil e coordenador do ranking publicado por AMANHÃ. Para ele, as campanhas das grandes empresas do Sul refletem fielmente seus princípios. “Do atendimento até a maneira como as empresas tratam seus funcionários, tudo influi no valor da marca”, define Tomiya. A julgar pelo exemplo da Coca-Cola, a marca mais valiosa do mundo, alinhar esses fatores é um esforço que vale a pena. Atualmente, o logotipo vermelho do mais famoso refrigerante do mundo é um ativo de nada menos que US$ 67 bilhões – o equivalente a 97% do valor de mercado da empresa.

Confira abaixo as dúvidas mais freqüentes sobre a atribuição de valores às marcas e as respostas de Eduardo Tomiya, Diretor da Interbrand no Brasil:

O valor da marca corresponde ao valor de mercado da empresa?
Não. O valor da empresa em geral é a soma de todos os ativos da empresa: os tangíveis (Maquinas, equipamentos, fábricas, terrenos, veículos, estoques, capital entre outros) e os chamados ativos intangíveis (Capital humano, Tecnologia, patentes, sistemas de distribuição, sistemas de produção, e talvez um dos mais importantes, a marca).

O valor total das empresas pode ser determinado por inúmeros métodos, como por exemplo o Fluxo de Caixa Descontado e os denominados múltiplos de mercado. O primeiro método baseia-se na projeção de fluxos futuros de caixa, e atualizados pelo Custo de Oportunidade dos provedores de capital da empresa (capital próprio e de terceiros). Ou seja, reflete a expectativa futura do acionista atualizada à uma taxa de risco de cada empresa.

Outro método pode ser o denominado múltiplos de Mercado, ou seja, múltiplos de receita, EBITAD. Este método é utilizado principalmente para precificar valor de empresas no Mercado de capital, e nos mercados desenvolvidos pode ser muito interessante e rápido sua utilização, haja visto que é simplesmente uma conta. As desvantagens deste método é que se utilizam parâmetros médios de empresas para os processos de valorização dos negócios, e isto pode minimizar a quantificação de algumas vantagens competitivas da empresa.

Por exemplo, o valor do Banco Itaú em 31 de Dezembro de 2004 é de US$ 17,97 Bilhões. O valor do patrimônio líquido do Banco Itaú era de US$ 5,4 Bilhões. Onde estaria então a diferença entre o valor contábil e o valor da empresa? Estes são os chamados ativos intangíveis da empresa, como, por exemplo, o capital humano, rede de agencias, tecnologia e a sua marca.

A importância destes ativos intangíveis vem crescendo cada vez mais, uma vez que cada vez mais os diferenciais competitivos da empresa estão fortemente associados aos chamados ativos intangíveis e também, com o aumento da competição não basta como era no passado, somente produzir. Hoje os consumidores possuem em quase todos os mercados opções, e isto faz com que outros intangíveis desempenhem um papel bastante importante. No passado os ativos tangíveis representavam 70% do valor das empresas. Na década de 2000, representam não mais que 30% do seu valor total.

Todas as empresas do Sul foram avaliadas?
Não. Foram avaliadas somente as marcas das empresas que figuram no ranking GRANDES & LÍDERES de AMANHÃ – ou seja, as que divulgam balanço financeiro junto àquela pesquisa. Da base de 500 empresas, selecionamos aproximadamente 60 empresas e aplicamos nossa metodologia de avaliação para cada uma delas, chegando ao ranking das marcas da região sul mais valiosas.

Por que o valor das marcas do Sul parece ser tão baixo se comparado ao patrimônio líquido das empresas que as controlam?
De fato, as empresas brasileiras em geral apresentam um valor de marca proporcionalmente menor do que as companhias norte-americanas e européias. Um exemplo é a Sadia: sua marca equivale a aproximadamente 11% de seu valor de mercado. Já no caso da Coca-Cola, a grife corresponde a aproximadamente 55% dos ativos. “As empresas do Sul têm estruturas muito robustas. As grandes companhias estrangeiras, por outro lado, procuram terceirizar a produção, uma vez que, conforme mencionado o diferencial competitivo não se reside exclusivamente em ativos tangíveis, mas também nos chamados ativos intangíveis e sua marca”, explica Tomiya, da Interbrand.

Texto: Francisco Mattar Botelho
Reportagem: Erik Farina